Introdução
A proposta desse estudo é apresentar com base nas letras das músicas de Raúl Seixas possibilidades de intervenções respeitando a especificidade da Educação Física e seus conteúdos. Para isso serão analisadas as letras das músicas de Raúl, serão feitas relações das críticas apontadas por Raúl no início da década de 70 com as críticas ao esporte moderno.
Foram escolhidas as músicas de Raul Seixas por se tratarem de músicas que na maioria das vezes fazem críticas ao contexto econômico-social da época e em três delas pude perceber que existia também a crítica ao esporte daquela época. Importante salientar que muitas críticas feitas por Raul Seixas são baseadas no período da ditadura militar brasileira, período crucial para a Educação Física e principalmente para o Esporte.
Os heróis da nação
O cantor baiano Raúl Seixas dentre suas inúmeras músicas, destacou em algumas sua maneira crítica de pensar a respeito do esporte, principalmente do futebol.
Em 1974, Raul Seixas lança o álbum Gita que tem na sua primeira faixa a música “Super Heróis”, composição dele e de Paulo Coelho. Nessa música surgem diversas críticas relacionadas ao esporte que podem ser trabalhadas nas aulas de Educação Física principalmente com os alunos do ensino médio.
Logo no início da música, Raul diz “Como é que eu posso ler se eu não consigo concentrar minha atenção, se o que me preocupa no banheiro ou no trabalho é a seleção”. Fazendo referência à grande importância dada ao futebol pelos brasileiros. Essa paixão chamou a atenção das “classes dominantes” que passaram a utilizar o futebol como forma de apaziguamento das massas como afirmam Junior e Chiapeta: “... o futebol enquanto "pão e circo" seria uma espécie de ópio que iria anestesiar os torcedores, desviando-os, assim, das mazelas cotidianas e de uma conscientização política da realidade.”.
Em seguida, ao analisar o trecho “Quem que no Brasil não reconhece o grande trunfo do xadrez. Saí pela tangente disfarçando uma possível estupidez” pode-se perceber que o autor relaciona estupidez com a falta de conhecimento sobre os “heróis” do esporte. Essa crítica segue a mesma idéia da crítica anterior de alienação causada pelo esporte que Junior e Chiapeta chamam de violência simbólica. “... fazer parte das várias formas de "violência simbólica" que alienam todos os torcedores”.
No refrão da música Raul canta de forma irônica “Vamos dar viva aos grandes heróis / Vamos em frente, bravos cowboys / Avante! Avante! Super-Heróis”. Nesse trecho o cantor saúda os heróis da nossa nação. Uma nação que só tem possibilidade de encontrar heróis nos esporte.
Em um país que “respira” futebol, que o esporte se faz presente na maioria dos horários, de onde mais a criança poderia tirar o seu ídolo?
Aos trancos e barrancos
Na música “Aos trancos e barrancos”, ao analisar o seguinte trecho “Pra que pensar se eu tenho o que quero, tenho a nega, o meu bolero, a TV e o futebol”.
Esse poder alienador do futebol foi muito criticado por Raul que sentiu na pele (viveu nesse período) a força desse fenômeno após a conquista do tricampeonato mundial de futebol.
Desde então o futebol vem sendo utilizado como mercadoria, um objeto a ser vendido para o povo. Produtos, marcas e bem de consumo vem ligando-se ao esporte com objetivo de ditar o que vai ser vestido e utilizado pelas pessoas. O futebol nesse momento é tratado como mercadoria pela indústria cultural.
Quando você crescer
Para a aula de Educação Física, o trecho “E o futebol te faz pensar que no jogo você é muito importante, pois o gol é o seu grande instante” serve como ponto de partida para as discussões sobre as críticas ao futebol.
Numa partida de futebol, aparentemente existe uma igualdade de chances, tendo em vista que os times encontram-se com o mesmo número de jogadores, cabendo apenas ao empenho e dedicação dos jogadores o resultado positivo. Para Bracht as coisas não acontecem exatamente assim, pois para ele existe uma outra variante refere-se à função ideológica do postulado da igualdade de chances no esporte. A igualdade formal de chances da estrutura esportiva indica para a presumível existência de uma correspondente forma de sociedade. Tal idéia nega a fundamental desigualdade de chances inerente à sociedade capitalista e eleva o princípio esportivo de igualdade de chances a um princípio geral da sociedade.
Além da utilização das letras como ponto de partida para as inúmeras discussões no campo da Educação Física, principalmente nas críticas ao esporte moderno, o professor pode utilizar as músicas de Raul para tentar traçar um perfil da Educação Física naquele período, que foi muito importante para a Educação Física. Pode-se também traçar uma linha comparativa do esporte daquela época com o esporte que é praticado atualmente. Esse trabalho pode começar com as músicas de Raul Seixas e se estender por pesquisas sobre as regras de hoje e daquela época, uniformes, busca por imagens... Esse trabalho também pode ultrapassar as barreiras da nossa disciplina e unir outras disciplinas que tratem da década de 70 ou ditadura militar como história, geografia, sociologia e/ou filosofia.
Conclusão
A análise das letras das músicas de Raul Seixas revela olhares diferenciados sobre a situação política que o país se encontrava no período das composições e sobre a maneira como o esporte era utilizado para fortalecer um pensamento hegemônico.
É preciso buscar formas de atrair esse universo dos jovens para dentro da sala de aula, fazendo com que aquilo que é dito nas aulas tenha um maior sentido para eles. Essa contextualização é essencial para aprendizagem do aluno e o próprio PCN reconhece sua importância para os jovens “A mídia está presente no cotidiano dos alunos, transmitindo informações, alimentando um imaginário e construindo um entendimento de mundo.”.
Esse estudo conseguiu fazer a relação das críticas feitas nas músicas de Raul Seixas e confrontá-las com as críticas feitas ao esporte de autores atuais. As críticas possuem idéias análogas, subentendo assim que as críticas feitas na época que as músicas foram compostas ainda permanecem na literatura atual.